27/02/2010

O QUE ESTÁ FALTANDO PARA O HOUSE?

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House é uma das séries de maior audiência em todo mundo. Exibida originalmente nos Estados Unidos pela Fox, no Brasil pode ser assistida no Universal Channel e na Rede Record.

Alguns ingredientes são garantia quase certa de sucesso, por pertencerem a aspectos da vida interna de cada um de nós: dinâmicas de personalidade complexas, difíceis de definir por generalizações de bom e mau, mas indivíduos com características marcantes, sem uma moralidade tradicional, que cativam por suas especificidades.

Pessoas que desempenham muito bem seu lado profissional, mas emocionalmente imaturas, como tantos de nós. Realmente é mais fácil desenvolvermos nosso intelecto do que nossa maturidade emocional, já que essa depende da maturidade de quem nos cerca intimamente.

A medicina é uma profissão encantadora, que gera muita curiosidade. Os médicos de pronto atendimento, especialmente, lidam diariamente com a dor física e psíquica intensa, urgente, dos pacientes. Para tal, contam com seu conhecimento e com os tratamentos existentes na atualidade, que obviamente são limitados.

A maneira como o médico encara as questões relativas a vida e morte bem como lidam com o próprio sofrimento são cruciais na formação de sua capacidade para lidar com os sentimentos dos pacientes. Como não perder a humanidade, a empatia com o sofrimento do outro e, ao mesmo tempo, conseguir um distanciamento racional para lidar com a doença?

Muitos médicos adotam uma postura distanciada, como proteção. O pouco envolvimento com as questões do paciente pode poupá-lo da dor, mas o preço a pagar é o de tornar-se um médico medíocre, pois uma das coisas que um paciente mais precisa, seja no sofrimento físico ou psíquico, é a presença real de um ser humano capaz de compreender sua dor e tratá-lo integralmente.

House M.D.

A série se passa em um hospital escola e os principais personagens integram a equipe de diagnósticos liderada pelo Dr. Gregory House, interpretado pelo ator inglês, Hugh Laurie, um excelente médico no que diz respeito a montar quebra-cabeças no caso de diagnósticos difíceis.

Para apimentar o personagem, embora ele consiga identificar doenças raras e curar pacientes é incapaz de lidar com sua depressão de maneira sadia. Algumas pessoas consideram essa característica excitante, mas a questão é: “o que tem de excitante nessa característica?”

Penso que possa despertar, em alguns, a vontade de montar o quebra-cabeça mais difícil de todos, de usarmos nosso poder de sedução para descongelar sentimentos, o desejo pelo inatingível, o inatingível nos protege da entrega, pois o outro já está defendido pelos dois.

A parte de si que ele mostra ao mundo, às pessoas, é resultado das defesas bem organizadas que ele teve que construir para sobreviver a algo que um dia ele teve, como amor, por exemplo, mas perdeu. Sabemos que ele já teve algum dia porque ele busca, e nós só buscamos o que sabemos ou pensamos existir.

A elaboração do diagnóstico alheio pode ser o ensaio de uma busca pelo diagnóstico individual que vá curá-lo. A busca e o interesse são motivados pelo interesse individual em resolver enigmas, por trás está o seu próprio.

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Muletas emocionais

A defesa, neste caso, o protege de possíveis frustrações mas, ao mesmo tempo, o impede de vivenciar algo espontâneo, verdadeiro e que pode machucar, como provavelmente foi o que aconteceu em sua vida. Ele não quer uma reedição dos acontecimentos, mas uma vivência parecida com um final diferente.

Ele faz uso de auto medicação utilizando uma substância que fornece sensação de euforia, já que ele não deve suportar seu humor depressivo habitual. Porém, isso só alivia o sintoma, mas não trabalha a causa. Esta é uma de suas muletas emocionais que utiliza e, curiosamente, ele usa uma muleta-objeto para andar.

Um médico que não suporta sua própria dor e quer anestesiar-se não gosta mesmo de olhar nos olhos de um paciente e realizar um comunicado delicado, estabelecer uma conversa, uma conexão mais pessoal. Para isso ele utiliza suas muletas contratadas (Foreman, Chase, Cameron, Taub, Kutner e Remy “Treze” Hadley) para exercer essas tarefas “sujas” e outras com as quais ele tem dificuldade em lidar.

Introspectivo, depressivo, traumatizado, rude, agressivo (para manter uma distância emocional que considera segura) e com poucos momentos onde revela sua humanidade, sua sensibilidade. Ou seja, um ser humano machucado em busca de si, ou do que foi perdido, protegido pela profissão e pelo status, mas impulsionado pelo trauma profundo que o torna um médico genial. A dor pode criar formas incríveis, embora nem sempre saudáveis.

por Fernanda Davidoff

Psicóloga com especialização em Psicoterapia Breve e orientação Winnicottiana e colaboradora do Portal “O que eu tenho?”.

(Imagens: Divulgação)

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FONTE:   Psicologia nas Telas: “Dr. House, um ser humano machucado em busca de si” | O que eu tenho?

Uma pergunta: o que você faz para fugir de si  mesmo?

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