22/05/2010

A Incapacidade do Homem Natural - J. C. Ryle

 

Verdades de singular importância sucedem-se, uma após a outra, no capítulo que estamos examinando. Provavelmente, em poucas partes da Bíblia encontram-se reunidas tantas "verdades profundas" como as de João 6. A passagem que lemos é um exemplo disso.

Em João 6.41-51, aprendemos que a condição de humildade assumida por Cristo, durante sua vida na terra, foi uma pedra de tropeço para o homem natural. Lemos: "Murmuravam, pois, dele os judeus, porque dissera: Eu sou o pão que desceu do céu. E diziam: Não é este Jesus, o filho de José? Acaso, não lhe conhecemos o pai e a mãe? Como, pois, agora diz: Desci do céu?" Se o Senhor tivesse vindo como um rei conquistador, com riquezas e honras para conceder aos seus seguidores e com exércitos poderosos ao seu comando, aqueles homens estariam dispostos a recebê-Lo. No entanto, um Messias pobre e humilde era uma ofensa para eles. O orgulho de seus corações os impediu de crer que ali estava o enviado de Deus.

Esse fato em nada nos surpreende. Com isso, vemos a natureza humana mostrando seu verdadeiro caráter. O mesmo também ocorreu nos dias dos apóstolos. Cristo crucificado era "escândalo para os judeus, loucura para os gentios" (1 Co 1.23). A cruz era uma ofensa para muitos, onde quer que o evangelho fosse pregado. Em nossos dias, podemos observar o mesmo acontecendo. Ao nosso redor há muitos que odeiam as evidentes doutrinas do evangelho, por causa do caráter de humildade que elas apresentam. Tais pessoas não podem suportar a verdade da expiação, do sacrifício e da substituição realizada por Cristo. Aprovam os ensinamentos morais e admiram o exemplo de abnegação dado por Ele. Mas, fale sobre o sangue de Jesus, sobre o ter sido feito pecado por nós; diga-lhes que a morte de Cristo é a pedra angular da nossa esperança e que a pobreza do Senhor Jesus se tornou a nossa riqueza; faça isso e verá como abominam essas verdades com ódio mortal. A ofensa da cruz certamente ainda não cessou!

Também aprendemos, nesses versículos, a falta de capacidade e poder do homem natural para arrepender-se ou crer. Encontramos aqui o Senhor Jesus dizendo: "Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer". Enquanto o coração não for atraído pela graça de Deus, o homem não poderá crer.

A solene verdade contida nessas palavras deve ser considerada com especial atenção. É inútil contestar que sem a graça de Deus alguém pode se tornar um cristão verdadeiro. Estamos espiritualmente mortos e não temos qualquer capacidade para dar vida a nós mesmos. Precisamos que uma nova vida seja implantada em nós, vinda do alto. Os fatos comprovam, e os pregadores o reconhecem. O décimo artigo da Igreja Anglicana declara expressamente: "Após a queda de Adão, a condição do homem é tal que, por sua força natural e boas obras, não pode mudar sua condição e preparar-se para crer ou clamar por Deus". Esse testemunho é verdadeiro.

Mas, afinal de contas, em que consiste essa incapacidade do homem? Em que parte de nossa natureza interior está a deficiência? Esse é um ponto sobre o qual surgem muitos erros. De uma vez por todas, lembremos que a vontade do homem é a parte onde se encontra a incapacidade. Sua falta de capacidade não é física, e sim moral. Não seria verdadeiro afirmar que o homem tem um desejo sincero e uma vontade autêntica de vir a Cristo, mas não possui forças para isso. Seria mais verdadeiro dizer que o homem não tem poder para vir a Cristo porque não tem desejo ou vontade de fazer isso. Não é verdade que ele desejaria vir a Deus, se pudesse. O correto é declarar que ele viria a Deus, se o desejasse. A vontade corrompida, as inclinações secretas e a necessidade do coração são as verdadeiras causas da incredulidade. É nesse aspecto que reside o engano. A capacidade que necessitamos é, na verdade, uma nova vontade. É exatamente nesse ponto que precisamos ser "trazidos".

Sem dúvida, estes assuntos são profundos e misteriosos. Através de verdades como essas, Deus prova a fé e a paciência de seu povo. Podem os seus filhos realmente crer nEle e esperar por uma explanação mais completa no último dia? O que não compreendem agora compreenderão mais tarde. De qualquer maneira, permanece bastante clara a responsabilidade do homem por sua alma. São realidades tanto a sua incapacidade quanto a sua responsabilidade. A incapacidade de vir a Cristo não o isenta de prestar contas. Se ele se perder, ficará provado que foi por sua própria culpa. O seu sangue recairá sobre a sua cabeça. Cristo o teria salvado, mas ele não quis ser salvo; não quis vir a Cristo para obter vida.

Por último, aprendemos que a salvação daquele que crê é algo presente. O Senhor Jesus Cristo assegurou: "Em verdade, em verdade vos digo: quem crê em mim tem a vida eterna". Devemos notar que a vida eterna é uma possessão presente. Jesus não disse que aquele que crê a receberá no último dia, por ocasião do julgamento final. Agora, no tempo presente e nesse mundo, essa vida se torna uma propriedade do crente, que possui a vida eterna desde o momento em que crê.

Este é um assunto que nos inquieta sobremaneira e a respeito do qual são cometidos inúmeros erros. Muitos pensam não ser possível recebermos, nesta vida, o perdão e a aceitação da parte de Deus. Essas coisas, dizem eles, são conseguidas ao longo de uma vida de arrependimento, fé e santidade; poderão ser recebidas apenas diante do tribunal de Deus, no último dia. Afirmam também que nem mesmo devemos ter a pretensão de obtê-las, enquanto vivemos neste mundo! Pensar assim é estar completamente enganado. O pecador é justificado e aceito por Deus no exato momento em que crê em Cristo. Para ele não há mais condenação. Ele desfruta de paz com Deus, imediatamente, sem qualquer demora. Seu nome está escrito no livro da vida, ainda que tenha pouca consciência disso. Pas¬sa a ter direito ao céu, direito este que nem a morte, nem o inferno, nem Satanás podem anular. Felizes os que conhecem essa verdade! Esta é uma parte essencial das boas-novas do evangelho.

Finalmente, o assunto fundamental que devemos considerar é se cremos realmente. Que ganharemos com o fato de ter Cristo morrido em favor dos pecadores, se não cremos nEle? "Quem crê no Filho tem a vida eterna; o que, todavia, se mantém rebelde contra o Filho não verá a vida, mas sobre ele permanece a ira de Deus" (Jo 3.36).

fonte: A Incapacidade do Homem Natural - J. C. Ryle | O PRINCIPAL DOS PECADORES

FORÇA PARA VIVER

 

Viver é muito perigoso... Porque aprender a viver é que é o viver mesmo... Travessia perigosa, mas é a da vida. Sertão que se alteia e abaixa... O mais difícil não é um ser bom e proceder honesto, dificultoso mesmo, é um saber definido o que quer, e ter o poder de ir até o rabo da palavra.
Viver é muito perigoso, dizia Guimarães Rosa pela boca do memorável Riobaldo. A vida tem mesmo seus altos e baixos e, além da dificuldade de saber a direção, falta a cada um a força e a competência de seguir em frente. Os obstáculos se multiplicam. A vida é contingente: cheia de imprevistos e surpresas, boas e ruins. Uma proposta para morar longe, um diagnóstico inesperado, a chegada de um bebê, um assalto, um desmoronamento, o cancelamento do voo, a festa de aniversário, os amigos ao redor da mesa e a demissão inesperada. Além disso, a doença da mãe, o imposto de renda, as aventuras dos filhos e o sobrepeso, obesidade mesmo, denunciada pelo espelho e pela calça que já não se usa mais. E tem também a teimosia dos vícios, as dores da alma, a insegurança emocional, os conflitos relacionais, a culpa, o medo, a ansiedade e a síndrome do pânico – ai que medo. Tem que arrumar o quarto, buscar a roupa na lavanderia, votar para presidente e superar o divórcio. O show não pode parar. E porque viver é muito perigoso, aprender a viver é imperativo.
Como enfrentar a travessia? Já que navegar é preciso e viver não é preciso, como dizia o poeta português. Viver é necessário. É preciso viver, não há que desistir da vida. Mas viver é perigoso, justamente porque não é preciso – não é exato. Não é possível singrar a vida como quem corta os mares. A gente quer ter voz ativa, no nosso destino mandar, mas eis que chega a roda viva e carrega o destino pra lá, disse o Chico brasileiro.
Acho que foi por isso que o sábio Salomão começou a escrever seu Eclesiastes. Queria aprender a viver. Dedicou o coração para saber, inquirir e buscar a sabedoria e a razão das coisas. E concluiu que a verdade está no distante e profundo. A vida é mistério. Viver continuará sendo sempre perigoso.
Então apareceu Jesus. Não negou a contingência da vida, nem iludiu os seus com promessas falsas e fantasiosas. Mas apontou um caminho. Apresentou seu Pai aos homens e os homens ao seu Pai. Autorizou todo mundo a buscar, usar e abusar de seu Pai.
Jesus disse a todos: Chamem pelo Abba. Ele os ouvirá. Falem com ele em meu nome. Batam na porta. Busquem. Peçam. Gritem. Importunem meu Pai, de dia e de noite. A porta se abrirá. Vocês acharão o meu Pai. Vocês receberão respostas. Serão recompensados pela sua busca, jamais ficarão sem galardão. Meu Pai é atento e cuidadoso. Meu Pai é bom. Meu Pai é amor. Não tenham medo dele. Não se escondam dele. Não fujam dele. Corram para os braços dele. Ele cuida de flores e passarinhos. Vai cuidar de vocês. Sigam os meus passos. Foi o que fiz. Fechem a porta do quarto e façam suas orações. Eu atravessei a vida de joelhos. E venci. Eu venci o mundo, eu venci o mal, eu venci a morte. E vocês também poderão vencer. Não desistam. Não tenham medo. Viver é perigoso. Mas a graça do meu Pai é maior que vida.
Ed René Kivitz

FONTE:   PavaBlog