07/03/2010

COM AS MULHERES

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Por Paulo Brabo

Estocado em Homens e Mulheres

– Está vendo essa mulher? Eu entrei na sua casa e você não me ofereceu água para lavar os pés. Ela, no entanto, lavou meus pés com lágrimas, e enxugou-os com os seus cabelos. Você não me cumprimentou com um beijo, mas ela, desde que entrou, não parou de beijar-me os pés. Você não me derramou óleo sobre a cabeça, mas ela passou essência perfumada nos meus pés.
Lucas 7:44-46

A distância cultural nos impedirá para sempre de apreender a extensão da sua influência e a absoluta novidade da sua postura, mas é certo que nenhuma outra figura masculina da Antiguidade ocidental – seja no domínio da realidade ou da ficção – sentiu-se mais à vontade entre as mulheres do que o Jesus dos evangelhos. Nenhum outro personagem do seu tempo, e talvez de tempo algum, fez mais para corrigir a distorção das lentes culturais através das quais a imagem da mulher era interpretada – e em muitos sentidos permanece sendo.

A singularidade de Jesus nesse aspecto não é menos do que tremenda. Acho notável ao ponto do milagroso que as posturas de Jesus diante das mulheres, conforme descritas nos evangelhos, não tenham sido censuradas posteriormente por homens menos preparados do que ele para abraçá-las.

É preciso lembrar o óbvio, que não faz cem anos que as mulheres alcançaram status social igualitário no ocidente, e que os evangelhos descrevem o que ocorreu há dois mil.

Numa época em que um marido não deveria dirigir-se à própria esposa em lugar público e homem algum deveria trocar palavra com uma mulher desconhecida (em ambos os casos para proteger a sua honra, não a dela), o rabi de Nazaré buscava a companhia amistosa de mulheres, puxava conversava com elas, tratava-as com admiração e naturalidade, interessava-se sem demagogia pelos seus interesses, deixava que tocassem publicamente o seu corpo e o seu coração.

O Filho do Homem não se constrangia em ser sustentado por mulheres, não virava o rosto à possibilidade de ser acarinhado por elas, não hesitava em recorrer a imagens que diziam respeito ao seu dia-a-dia, não sonegava histórias em que mulheres eram (muito subversivamente, na ótica do seu tempo) exemplo de humanidade, de integridade, de engenhosidade e de virtude.

Falamos de um tempo, num certo sentido não muito distante, em que os homens que não denegriam abertamente a imagem da mulher soterravam-na por completo debaixo de idealizações simplistas. Dependendo de quem estava falando, a mulher era vista como incômodo necessário, como homem imperfeito, como criança, como objeto mecânico de desejo, como objeto idealizado de poesia, como animal fraco e sensual; figura às vezes inocente, às vezes desejável, normalmente imprevisível, normalmente indigna de confiança, invariavelmente inferior.

Contra esse cenário, o rabi de Nazaré resgatou uma mulher adúltera das garras da justiça e da morte sem recorrer ao que seria o mais fácil e popular dos argumentos antes e depois dele, o que afirma que a mulher é criatura de mente obtusa e vontade fraca, particularmente suscetível às sensualidades da carne. Num único golpe eficaz ele transferiu a culpa da mulher acuada para os seus acusadores, todos eles homens e emblemas de poder e desenvoltura, até serem publicamente dissolvidos pela mão de Jesus. A vítima, a transgressora, foi ao mesmo tempo salva da condenação e tratada, talvez pela primeira vez, como ser humano independente e responsável (João 8:1-11).

Aqui estava um homem que, irresistivelmente, olhava para as mulheres sem rebaixar-se a preconceitos ou recorrer a idealizações. Jesus lia as mulheres como seres humanos, e foram necessários séculos para que o mundo arriscasse repetir a sua ousadia. Ainda hoje, transcorridos milênios ineficazes, não há homem que esteja imune a ler a mulher através de estereótipos novos e velhos; ainda somos tentados a enxergar o homem incompleto, a flor de pureza, a criança sem rédea. Mas ali, nas esquinas empoeiradas de um canto do mundo, as estruturas do mundo social haviam sido abaladas para sempre.

Para mim não há evidência maior de que o espírito subversivo de Jesus permaneceu vivo nos primeiros discípulos, logo após a ressurreição, do que a descrição da comunidade de seguidores em Atos 1:14: “Todos estes [homens] perseveravam unanimemente em oração, com as mulheres, e Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele”.

Este com as mulheres me pega desprevenido todas as vezes, tanto pela sua necessidade quanto pelo impensável que representava no seu tempo. Em retrospecto é difícil avaliar o quanto está sendo efetivamente dito aqui, mas é preciso lembrar constantemente que naquela cultura as esferas de atividade de homens e mulheres eram divididas ao ponto do incompatível. Essa fenda corria de uma ponta à outra o tecido da sociedade, mas seu ponto nevrálgico talvez residisse na esfera religiosa, na qual era preciso ser homem para ter participação eficaz – isto é, para ter acesso verdadeiro e relevante à divindade.

Na visão de mundo vigente homens e mulheres habitavam espaços separados no universo; essa incompatibilidade era espelhada na sociedade e prontamente celebrada através de espaços diferenciados de adoração. Tanto o Templo quanto as sinagogas tinham áreas separadas para homens e mulheres, e os recintos reservados para os homens ficavam invariavelmente mais próximos de Deus. Era uma sociedade em que não ocorreria a ninguém colocar homens e mulheres compartilhando voluntariamente de um mesmo espaço, muito menos um espaço religioso.

Agora que Jesus havia subido ao céu e os homens de branco haviam dito que mantivessem os olhos fixos na terra, os discípulos viram-se diante de um problema e de um embaraço. Jesus, o amigo das mulheres, havia partido, mas as mulheres haviam ficado. Deveriam eles, homens de respeito e maridos de boa fama, retornar ao antigo e unânime padrão social, devolvendo as mulheres ao seu devido lugar? Agora que Jesus não estava mais ali para efetuar a sua mágica, não seria inevitável que restabelecessem a fenda social que ele havia coberto temporariamente? Quando a multidão de seguidores retornasse a Jerusalém (onde Jesus dissera que aguardassem) deveriam o grupo de discípulos e o de discípulas “perseverar unanimemente” em recintos separados?

Escolher o contrário, escolher o abraço comunitário e a convivência santa nos padrões inaugurados por Jesus, seria nadar contra a corrente de todas as instituições sociais em efeito no seu tempo. Um observador só encontraria um modo razoável de interpretar uma reunião voluntária e regular entre homens e mulheres: como ocasião para licenciosidade. Foi efetivamente dessa maneira que as reuniões cristãs “de amor” foram interpretadas por seus antagonistas ao longo de seus primeiros séculos. Tinham que ser desculpas para sexo – porque, que mais poderia um homem querer fazer com uma mulher?

A momentosa decisão encapsulada nesse único verso demorou a encontrar compreensão e aceitação, tanto dentro quanto fora do grupo. Escolhendo reunir-se regularmente no mesmo recinto, tanto homens quanto mulheres abriram voluntariamente mão da ficção da “boa fama” em troca da generosidade, da inclusão e da convivência. Escolhendo sentar-se de modo criativo ao lado de um Outro com quem não criam ter nada em comum, romperam um véu ancestral e convidaram o mundo a explorar um universo de possibilidades inimaginadas. Nos dois casos, seguiam o desafio formidável deixado pelo exemplo de Jesus.

FONTE:   Bacia das Almas - Onde as idéias não descansam » Com as mulheres

Minha resposta sobre a Dake ao pastor Altair Germano

 

Peço vênia ao Reinaldo Azevedo para fazer um vermelho e azul com o pastor Altair Germano sobre a sua última postagem a respeito da Bíblia Dake. Não postei lá por tratar-se de um texto mais longo, que não caberia no espaço dedicado aos comentários. Mas inicialmente faço duas observações: primeiro em relação ao título, que põe em dúvida a idoneidade da CPAD, como se ela pudesse outra vez deixar de cumprir a resolução aprovada por unanimidade por ambos os órgãos da CGADB - Conselho de Doutrina e Comissão de Apologética. Se isso acontecer, a instituição perdeu toda a credibilidade e só resta fechar as portas da CGADB.
A segunda observação tem a ver com o fato de o pastor Altair Germano, fugindo à regra em seu blog, assinar a postagem como se faz em documentos oficiais, citando as funções que exerce na CGADB (vice-presidente do Conselho de Educação e Cultura) e na UMADENE (relator do Conselho de Doutrina). Se o fez com a autorização de seus pares e falou em nome de ambos os órgãos, a crise tornou-se mais grave, não quanto à UMADENE, mas em relação ao Conselho de Educação e Cultura da CGADB, pondo-o em rota de colisão com dois outros conselhos da mesma instituição, posto que, embora no texto diga que a CPAD deve cumprir a decisão, no título levanta a hipótese, como dito acima, de ela não cumprir.
Mas se o caro colega fez uso das prerrogativas sem o consentimento dos pares numa postagem pessoal, foi uma atitude inapropriada a qual compromete os órgãos aos quais pertence, sobretudo o da CGADB, já que não se trata de um pronunciamento que represente alguma posição oficial de ambos. Isto não minimiza a crise, mas, ao contrário, cria uma situação de constrangimento e revela não ter havido cuidado ao presumir representatividade com as respectivas citações. Em ambos os casos, tenha sido oficialmente ou não, a menção só amplia a gravidade da crise que o imbróglio Dake gerou. O caso do pastor Carlos Roberto não serve como exemplo porque ele só veio ao blog que administra por duas vezes após decisões tomadas pelo órgão do qual faz parte, o Conselho de Doutrina da CGADB, para publicar a sua posição pessoal em total alinhamento com o que foi decidido.
Para não me estender mais, vamos então ao vermelho e azul que prometi no início da postagem. Após levantar dúvidas no título, o colega Altair Germano aduziu:
"Pelo menos é esta a informação que circula na blogosfera evangélica".
Como está escrito, meu caro pastor Altair Germano, passa a impressão de que um grupo de boateiros, de pessoas que não têm o que fazer, divulgou tal versão como se não houvesse uma fonte digna de crédito para sustentá-la. Isso é induzir o leitor ao erro. Quem primeiro informou o fato foi o pastor Carlos Roberto, secretário do Conselho de Doutrina da CGADB, que participou da reunião onde o veto à Dake foi mantido pelo voto unânime de todos os presentes mediante nova resolução que reitera os termos da primeira e, a essa altura, já teve estar percorrendo os trâmites legais para chegar aonde precisa chegar. Portanto, meu caro colega, trata-se de um fato, não de pressuposição ou boatos.
"Essas citações foram extraídas da caixa de minha Bíblia Dake (que por sinal não vendo, não troco nem dou, pois é uma ótima ferramenta de pesquisa). Vale salientar que as opiniões citadas se fundamentam na edição americana, sem cortes e sem censura. Sobre os autores das declarações acima, dispensa-se qualquer comentário".
As citações que o caro colega menciona são dos pastores Elienai Cabral e Antonio Gilberto, aos quais prezo e respeito. Mas, sem tirar o mérito que ambos têm, o que vale mais do ponto de vista institucional: o que eles disseram ou a decisão emanada do Conselho de Doutrina, com o suporte da Comissão de Apologética, que tem a autoridade de deliberar sobre temas doutrinários ligados à Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil? Creio que a própria pergunta traz a resposta.
"Com certeza, a visão de ambos foi acadêmica, como é a minha".
A ressalva não ameniza o problema, pois o que se questiona não é isso, mas a publicação da obra por uma editora confessional. Nem eu, nem o pastor Carlos Roberto, nem o pastor Robson Aguiar, nem o pastor Jessé Sobral e muitos outros que se posicionaram contra a decisão jamais pomos em dúvida o seu valor acadêmico, como não pomos em dúvida o valor de muitas obras que sequer têm caráter religioso ou cristão. Nosso questionamento sempre se voltou para o fato de a CPAD - uma editora confessional que pertence às Assembleias de Deus - publicar uma Bíblia de Estudo que contém um amontoado de notas que são pura heresia e contradizem os fundamentos que professa a mesma denominação. É contraditório. Já dissemos isso, mas convém repetir para refrescar a memória: fosse publicada por uma editora independente, os nossos blogs estariam cuidando de outros temas. É constrangedor saber que editoras como a Cultura Cristã e outras confessionais mantêm-se firmes em seu compromisso de não publicar obras que conflitem com a fé que professam, enquanto nós, se não corrigirmos a rota, estamos dando passos em direção ao liberalismo.
"Mantenho tudo o que escrevi sobre o assunto".
É uma atitude coerente, como o é também a de todos os que nos opomos à publicação. Coerência por coerência, prefiro ficar com a nossa, que é coerente contra os ventos de doutrina que sopram de todos os lados e surgem a partir de comentários como estes da Bíblia Dake lançada pela CPAD. De que adiante retirar a teia, se a aranha permanece? É o princípio de causa e efeito. Diria o irmão: mas se fosse lançada por uma editora independente, não seria a mesma coisa? Ora, a diferença é enorme. Teríamos muito mais autoridade para combater os erros oriundos dela do que temos agora. Como combater a teologia da prosperidade, se a Bíblia publicada pela CPAD a defende? Como combater o teísmo aberto, se a Dake, obra-prima da editora assembleiana, afirma que Deus se autolimita e que em muitas situações só conhece os fatos quando estes acontecem? Perdemos todo o crédito para esse combate.
"Respeito a posição do Conselho de Doutrina e da Comissão de Apologética".
Essa afirmação contradita a outra no início do texto, aqui já comentada, onde, para justificar o título duvidoso, diz com certa ironia que é uma informação que circula pela blogosfera evangélica, como se não se soubesse a origem. Ou seja, o que o caro colega escreve é ambíguo. Mas ainda bem que, embora contraditoriamente, reconhece que a posição anunciada na blogosfera não é simplesmente "uma informação", mas a posição de ambos os órgãos da CGADB.
"Entendo que a CPAD deve cumprir a resolução".
Ora, se o caro colega assim entende, por que levantar, no título, a hipótese de a editora não cumpri-la? Pressa em escrever o texto? Dúvida sincera sobre a idoneidade dos que a dirigem? Ou a expectativa velada de um cabo de guerra entre a CPAD, o Conselho de Doutrina e a Comissão de Apologética da CGADB para ver quem leva a melhor? Ou a certeza de que tudo será varrido para debaixo do tapete?
"O que o Conselho de Doutrina e a Comissão de Apologética farão em relação às outras obras publicadas com conteúdo doutrinário divergente do que se ensina nas lições bíblicas, nos seminários e púlpitos de nossas igrejas?"
Outra resposta óbvia. Devem fazer o mesmo que fizeram quando reprovaram o movimento de Boston, as heresias do G12 e, agora, a publicação da Bíblia Dake. Não se espera menos do que isso. Esse episódio ajuda a que estejam mais atentos e acompanhem mais de perto a editora, promovam simpósios teológicos e zelem pela saúde editorial das obras que a igreja recebe.
"O que o Conselho de Doutrina e a Comissão de Apologética farão em relação ao 1º vice-presidente da CGADB, que publica uma Bíblia e promove abertamente a Teologia da Prosperidade condenada pelos próprios presidentes e membros dos magnos conselho e comissão?"
Primeiro, já é um grande passo quando o caro colega reconhece que os membros dos "magnos conselho e comissão" combatem a teologia da prosperidade e certamente reprovam os ensinos da Bíblia publicada pela editora pertencente ao primeiro vice-presidente da CGADB. Segundo, a dita editora não é confessional, ou seja, não pertence a uma denominação, nem a Assembleia de Deus, portanto nem o Conselho de Doutrina, nem a Comissão de Apologética têm prerrogativas para aprovar ou reprovar as suas obras. Terceiro, pela posição que ocupa, é um caso muito mais para o Conselho de Ética e Disciplina da CGADB do que para os órgãos mencionados. Quarto, qualquer membro da CGADB pode representar contra outro membro, desde que obedecidos os trâmites legais e haja consistência na representação para que a apuração dos fatos seja acatada. Não seria o caso de o caro colega encaminhar essa representação?
"O que o Conselho de Doutrina e a Comissão de Apologética farão em relação aos livros de origem secular, católicos, reformados e de outras linhas doutrinárias e teológicas que são vendidos nas lojas da CPAD? Publicar não pode. Vender pode?"
Se o caro colega não sabe, esse assunto já foi amplamente discutido pelo Conselho de Doutrina em outros interregnos e a resolução foi radical: venda proibida nas livrarias da CPAD de livros que firam a doutrina esposada pelas Assembleias de Deus. Ao que eu saiba, não foi revogada. Basta apenas exigir o seu cumprimento. Quem os quiser comprar para o seu exercício acadêmico tem onde encontrá-los. Afinal, a CPAD não visa lucro, mas servir as igrejas. Agora, aqui, cabe outro comentário sobre o que é essencial e não essencial (sei o que pensa sobre isso), em relação a obras de caráter doutrinário, o qual deixo para depois para não cansar os leitores.
Para encerrar, creio que é hora de refletir, não acirrar os ânimos ou deixar pressusposto que podemos ainda experimentar uma longa batalha por causa da Bíblia Dake. Todos, ao contrário, deveríamos, sem dubiedade, demonstrar à CPAD que o melhor caminho, agora, é o da obediência. Esse é um nó que precisa ser desatado. A persistir assim, os outros nós continuarão como estão. Também não é prudente a CPAD acreditar que está voando em céu de brigadeiro. Se não houver mudança de rota, a aeronave pode cair.

Postado por Pastor Geremias Couto

Manhã com a Bíblia: Minha resposta sobre a Dake ao pastor Altair Germano