17/02/2010

MATAR E MORRER…OUTROS SIGNIFICADOS.

 

Não vale matar



"Se o quinto mandamento é considerado o mandamento das crianças, esse é considerado como o mandamento dos outros; nunca o nosso."


"'Nós não matamos! Ouvimos sobre isso, mas nunca cometemos delitos dessa natureza. Isto está muito além da maldade que há em nós', pensamos. Não sabemos, contudo, que quebramos esse mandamento muito mais do que imaginamos."


"A tradicional interpretação diz que esse mandamento nos proíbe de tirar a vida de alguém. Certa está, visto que Deus é sempre pró-vida. Como seres criados à sua imagem, devemos viver para promover vida - da forma que pudermos."


"Meu problema com tal interpretação está no risco que ela oferece. Há quem pense que, desde que o coração continue a bater, não importa o que se faça com uma pessoa, já que o mandamento não foi quebrado."


"Esquecem-se, os que assim pensam, que se mata de diversas outras formas: com palavras, atitudes, olhares e gestos."


"Vivemos em uma sociedade de assassinos e suicidas, já que matamos aos outros e a nós mesmos, ainda que jamais tenhamos derramado o sangue de alguém no chão."


"Há cristão que se orgulham de nunca terem empunhado uma arma, mas que matam aqueles com quem se relacionam todos os dias através do que fazer e/ou dizem."


"Somos, por isso, todos culpados pela constante quebra deste mandamento."


"'Não matarás' é o grito de um Deus que morreu a nossa morte para vivermos e promovermos sua vida."


"Cabe-nos, portanto, pedir auxílio a Deus para vivermos fazendo o que fomos chamados a fazer: promovendo vida."

FONTE:   Fé Verdadeira para um mundo Real

O CHAMADO PROFÉTICO NA POLÍTICA



Carlos Bezerra Jr.

O assunto me mobiliza. Talvez seja o discurso da minha vida. Mas pudera, não é? Encontrar o propósito de Deus em nosso cotidiano é a tarefa principal de cada ser humano. No dia-a-dia do médico, absorto no sofrimento dos seus pacientes, é fácil. No da assistente social e seus desvalidos, no do advogado e os injustiçados da vida, no do empresário que sustenta tantas famílias com seu negócio. Bom, mas meu cotidiano é a política, e daí? Pois me arrisco a dizer, e explicarei nas próximas linhas, que não existe vocação mais santa do que a vida pública. Pelo menos era o que dizia Calvino.

Primeiramente, gostaria de analisar a aversão que se formou na igreja quanto à política. A ascensão dos evangélicos no cenário nacional levou à inexorável eleição de representantes. Assim mesmo é que deve ser: todo e qualquer grupo social tem de se fazer representado no Congresso. Porém, desde aquela época, o pensamento corrente era o menos correto: temos de ocupar o parlamento para defender os interesses da Igreja, ou, pior, da nossa denominação! O fim disso, como se viu, foi devastador: não houve um grande escândalo nacional ou local que não tivesse um evangélico envolvido. Que desolação!

Entre todas as explicações plausíveis, passamos a pensar que a política é algo sujo mesmo, a serviço de satanás, que não havia jeito. Mas na verdade isso é um engano. Imagino que o povo de Deus no deserto também chegou a pensar que aquela aridez era infinita e que a Terra Prometida era uma ilusão qualquer, quando, de fato, ela existia. E qual seria a promessa para a política, então? Ora, para o que ela foi criada: promover a Justiça entre todos os cidadãos. Sim, é a arte da negociação, mas numa visão bem republicana, com a qual conduzimos a política hoje, é o cuidar bem da “res” pública, e na visão democrata, cuidar de forma que a vontade da maioria prevaleça.

E o que é a justiça? É dar a cada um o que é seu, dizia Tomás de Aquino. É justo que um estudante de classe média, que sempre estudou em bons colégios, dispute o vestibular da USP em pé de igualdade com rapaz pobre da periferia que estudou em escolas públicas depredadas? Sem dúvida, não é. No Brasil, a pobreza tem cor: é negra. Por isso, a política vem discutindo as cotas como forma de compensar a injustiça no acesso à universidade. Você pode discordar delas, mas, enfim, é pelo menos uma tentativa.

Quando passei a me debruçar sobre a questão do abuso e da violência sexual contra crianças, fui questionado sobre o porquê de me dedicar tão severamente a um tema. Havia várias respostas na ponta da língua. Chega a ser óbvio lutar para impedir tamanha barbaridade, mas não pensei duas vezes antes de responder: por causa da injustiça. Imagine construir uma sociedade sobre as marcas do abuso? “A injustiça em qualquer parte é uma ameaça à justiça em toda parte”, dizia Martin Luther King, que lutou pela igualdade racial nos Estados Unidos e que, coincidência, vai... era pastor batista. Somos, nós todos cristãos, os bem-aventurados dessa sociedade que têm sede e fome de justiça.

Mas ao elegermos tantos cristãos no passado, não estávamos preocupados com “o mundo”, com a justiça, com os que sofrem, estávamos, isso sim, atentos ao nosso próprio umbigo: como disse, queríamos pessoas que defendessem a igreja no Congresso, estavam muitos dos líderes ocupados com a formação de seus impérios. Pode uma fonte dar água limpa e suja ao mesmo tempo?, questionou o Mestre certa feita. Da mesma forma, enviar à política pessoas imbuídas do propósito de apenas proteger as denominações resultou na formação de um típico homem público evangélico: o despachante de igreja. Como ousamos questionar quem se elege para defender seus próprios interesses quando elegemos muitos para defender os nossos? Ora, quem protege a igreja de Cristo é o Dono dela!

Estamos, nós, cristãos, em qualquer lugar, prontos para servir. Há verdadeiramente uma maneira de atuar de forma profética na política e somos chamados com urgência para isso. A sociedade anseia por soluções onde o debate sobre o futuro é travado, ou seja, na política. Injustiça social, miséria, aquecimento global, desmatamento, meu Deus, são tantas as questões! Que adianta engordarmos espiritualmente dentro de nossas comunidades se os frutos que damos não chegam a quem tem fome? No passado, os profetas de Deus eram aqueles que diagnosticavam o presente e apontavam soluções para o futuro, denunciavam que havia morte na panela, que havia injustiça, que havia crise moral. Agora, parece-me que nos esquecemos que profecia não fala de futuro, fala de verdade moral, condena o aviltamento dos valores da família e defende uma postura progressista nas questões de justiça racial, apenas para citar exemplos.

Como cristão, vejo crianças abandonadas em lagoas para que morram à própria sorte, vejo crianças atiradas pela janela, vejo a explosão da pedofilia na Internet. Segundo a

Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, uma criança é abusada sexualmente no Brasil a cada 8 minutos. Senhor, não posso ficar de braços cruzados diante desse descalabro! Não posso dormir um sono tranqüilo ouvindo o pedido de socorro de tantas crianças. Há pouco mais de um mês uma lei de minha autoria criou o Programa Municipal de Conscientização e Combate ao Abuso Sexual e à Violência contra a Criança. Agora, os funcionários de creches serão treinados para identificar e ajudar crianças em perigo, e esse é apenas o começo: a formação se estenderá a médicos, guardas-civis, conselheiros tutelares etc.

É isso é ainda tão pouco! Em uma sociedade capitalista ao extremo, que elogia a competição, que premia apenas os mais fortes, que sacrifica o Planeta em favor do lucro, que ouve apenas os testemunhos de sucesso financeiro, que exclui radicalmente os mais pobres, nesta sociedade, quem levantará o seu cajado no deserto para lembrar dos idosos, das crianças, da gestante, da viúva? Onde está o papel da Igreja como consciência profética?

Sim, continuamos sendo chamados a ser o sal da terra. Sabe que o sal serve não apenas para dar sabor à carne? Ele é também usado para impedir que ela apodreça. Por isso, não desisto de colocar meu candeeiro no parlamento paulistano, porque acredito que é esse o compromisso do cristão autêntico: fazer brilhar a luz de Cristo o máximo que puder. Aliás, vou além, digo que se minha consciência cristã, se minha fé, não me levar a indignar-me com as injustiças nessa cidade, se ela não me fizer buscar novas soluções para os conflitos que vivemos dia a dia, então, que diferença faz ter fé?
Colaboração: Roberta Lima